quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Andalucía Bike Race – Dia #4 - “Os meninos não me deixam brincar com eles!!”

Hoje a etapa começou e terminou num “pueblo” a cerca de 20km de Jaén, de nome Mancha Real. Mas à semelhança de Jaén, tudo à volta são montanhas, algumas delas com um manto branco no seu cume. Segundo o gráfico da etapa de hoje, iriamos chegar aos 1500 metros de altitude. Eu e o Zé, quando seguíamos de carro para a partida, pusemo-nos a adivinhar qual daqueles cumes à vista teríamos que subir...e descer.
Foi a etapa mais curta desta edição da Andalucia Bike Race. Mas mais uma vez, foi a que mais me custou passar até agora. Significa que o nível de cansaço físico mas também mental aumenta de dia para dia. A etapa anterior deixou-me o corpo bastante maltratado. Não só pela queda que dei ao atravessar a tal ponte de metal a 2km da chegada, mas sobretudo pelos muitos metros ou possivelmente até quilómetros que andei em vez de pedalar, em descidas com mais de 30% de inclinação e com pedras escorregadias à mistura.
Hoje de manhã sentia praticamente todos os músculos do meu corpo. Quando digo “sentir” refiro-me a dor. Pernas, costas e até braços! Quase não sabia andar, ou como se costuma dizer, hoje tinha um andar novo!:) 

Mas o que mais me preocupava era o joelho direito. O mesmo que sofreu um traumatismo na Brasil Ride 2013, tinha sofrido um novo embate na queda de ontem! Estava na expectativa como iria se comportar durante a etapa de hoje.
Sento dor mas deu para a gerir. Não sei se a dor que sinto foi deste embate ou se agravou a lesão anterior. Só daqui a uns dias saberei.
A etapa começou às 10h00. Um lindo dia de sol, mas muito frio. Cerca de 4ºC. Antes da partida andávamos todos à procura de sol.

O arranque mais uma vez foi...”nas horas do ca..tano!”. Os primeiros 4km em asfalto, mas em subida. Mal virámos para a mata, começa confusão! Todos com uma falta de ar, como se a etapa terminasse ali à frente! Muitos desses participantes com “falta de ar” já estão com mais de uma hora de atraso na classificação. Confesso que hoje não estava mesmo com paciência para disputar os melhores lugares ou trajetórias. Acho que me esqueci de ligar o “chip” de competição. Deixava passar toda a gente e nem reclamava. Só não queria era cair de novo. Este comportamento terá sobretudo a ver já com algum cansaço mental mas também com uma boa dose de frustração.
Em criança, como a maioria da minha geração, passava quase todo o meu tempo livre na rua, agarrado a uma bicicleta.
Uma bicicleta de menina, comprada em segunda mão, mas alterada para BMX. Era a minha companheira de aventuras e diabruras. Fazia tudo com ela, e era malabarista. Fazia descidas dignas de um trilho de Downhill, e andava com a roda da frente no ar o tempo que eu quisesse. Drops com menos de um metro de altura nem dava para aquecer! Isto até aos meus 13 anos de idade. Depois virei para o ciclismo de estrada. As capacidades físicas melhoraram consideravelmente, mas a técnica, essa, perdia praticamente toda.
Só há cerca de 6 anos é que comecei a utilizar uma bicicleta, que não de roda fina de forma mais assídua. Isto já com 39 anos de idade. Mesmo assim, com o passar do tempo, a minha técnica e confiança melhoraram bastante, e posso até dizer que não ficava envergonhado em qualquer maratona de nível nacional, mesmo nas mais técnicas. Mas o ano passado dei um grande passo atrás. Ao decidir preparar-me e participar de novo na Volta a Portugal em Bicicleta (de roda fina), coloquei a BTT de lado praticamente todo o ano de 2014. Dediquei-me exclusivamente ao treino para provas de estrada. Acreditem que isto foi o suficiente para perder completamente a confiança em cima de uma BTT! Não digo que voltei à estaca ZERO, mas estou lá perto.
A minha “sorte” é que as minhas capacidades físicas compensam em grande parte a falta de técnica. Pode parecer-vos presunção da minha parte, ainda mais que neste momento somos líderes (master-40) da ABR, mas acreditem que ainda estou longe da minha melhor forma física para o BTT. Tanto é que ao quarto dia já me doem quase todos os músculos do meu corpo! Em boas condições isso não aconteceria.
O facto de eu estar a aguentar o ritmo do meu colega José Rosa, que se tem aplicado seriamente nos treinos, e de estarmos com uma vantagem superior a meia hora para a segunda equipa, tem a ver sobretudo com as minhas capacidades físicas natas, ou genética, como queiram chamar. Mas ter vindo para a ABR com alguma falta de treinos e sobretudo ritmo de competição, faz com que eu de dia para dia vá sentido cada vez mais dificuldades em recuperar, ao passo que o meu colega quase não tem sentido quebra.
Moral da história: podes ser um dotado, mas se não treinares, vais sofrer, muito!
Pois, é o que me está acontecer nesta prova. Possivelmente uma das mais duras do mundo! E quando não estás bem fisicamente, o psicológico também se vai abaixo. E nem mesmo o facto de sermos líderes me tem dado ânimo!
Estou farto desta prova!
Por falta de confiança, porque não me divirto onde toda a gente parece se divertir, e como se não bastasse, agora também porque me dói o joelho!
Por outro lado, tenho noção que esta prova é importante para a nossa preparação para a Absa Cape Epic, e mais importante ainda, porque o meu companheiro está a ter uma oportunidade única, julgo eu, em toda a sua longa carreira como atleta. Ser líder de uma prova por etapas, e ainda mais internacional. Será por esta razão que o José Rosa anda eufórico e com uma moral do tamanho do mundo  O meu receio é que esta euforia nos leve a cometer excessos ou erros que ponham em risco a nossa participação na Cape Epic.
Estou sempre a relembra-lo que já temos os bilhetes comprados para a Cidade do Cabo, e que esse é o nosso principal objectivo, e que a ABR seria só para virmos treinar e desfrutar as paisagens.
A etapa de hoje terá sido pura diversão para os puros betetistas. Cerca de 30-40% da etapa era composta de single-tracks. E para todos os gostos. A subir com degraus em pedra, a descer com drops em pedra, a descer no meio do pinhal com curvas em cotovelo, ...
Eu parecia aqueles putos a queixar que “os meninos não me deixam brincar com eles!”. Acho que era o único que queria subidas longas em estradão ou descidas muito rápidas.
Mesmo com esta tão grande falta de vontade, acabámos por vencer também esta etapa. Mas desta vez com “apenas” 4 minutos de vantagem. A vitória de hoje é, em grande parte, “culpa” do José Rosa. A minha vontade hoje não era mesmo nenhuma. É por estas e por outras que serve uma equipa. Há sempre um elemento em condições para levar o barco a bom porto 
Amanhã temos mais uma longa etapa. 86km mas “só” com 2.000 de desnível acumulado. Se aquilo que me têm dito sobre a etapa estiver correto, será mais uma filme de terror para mim.
Ai que saudades que tenho de Sintra...e de um bom vinho tinto ao jantar!! tongue emoticon


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